Informatização exige das empresas controle maior
A única certeza que há é que as empresas sonegadoras devem compreender que esta postura não mais condiz com a realidade do paí
Todo Estado é movido pelos pagamentos feitos pelos cidadãos, ou seja, pelos tributos. Esse é o combustível principal para o movimento da máquina pública na prestação de serviços essenciais e realização do pilar da República: o exercício da cidadania pelos administrados.
Tão necessário é o financiamento do Estado que o tributo tem natureza compulsória, isto é, não depende da vontade do contribuinte em pagar ou não. Igualmente, não é oponível o argumento de que não se utiliza da destinação legal da arrecadação (por exemplo, alguém que não se utiliza do Serviço Único de Saúde – SUS).
Contudo, desde sempre, o modelo capitalista pressupõe o acúmulo de riqueza para o aumento do consumo, que, por sua vez, requer maior acúmulo de riqueza, figurando este ciclo como a dialética do sistema. Nesta regra estritamente individual, o Estado apresenta-se como uma espécie de confiscador, retirando a riqueza daquele que assim laborou para tanto.
Este pensamento por milênios logrou efeito, “forçando” o contribuinte a não demonstrar ao Estado sua verdadeira riqueza, em face de sua “necessidade” imposta pelo modelo capitalista. A sonegação, assim, é uma das práticas mais antigas realizadas pelos homens, desde o camponês que escondia sua colheita até as grandes empresas que forjam prejuízos.
Em outra mão, o Estado (em qualquer acepção) sempre buscou maneira de diminuir a sonegação por meio de criação de instrumentos efetivos ao controle dos administrados. Neste viés, o Brasil vem aparelhando e criando possibilidades para que a fiscalização seja eficaz ao ponto de não se ter mais o velho conceito de que o não pagamento de tributo compensa.
Uma das medidas neste sentido foi a criação da chamada Super-Receita (Lei 11.457/07), isto é, o órgão agora chamado de Secretaria da Receita Federal do Brasil é responsável por todos os tributos em âmbito federal, bem como planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas a tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais da seguridade social.
Outro fator de efetividade foi aliar a informatização de dados importantes (dados constantes em cartórios — bens imóveis, contratos públicos, etc. —, DETRAN´s — propriedade de veículos, motos, barcos, jet-skis e etc. —, bancos — cartões de crédito, débito, aplicações, movimentações, financiamentos —, etc.) com os convênios entre os entes públicos, ou seja, a troca de informação no âmbito federal, estadual e municipal.
Assim, em um futuro muito próximo, a Nota Fiscal Paulista, a Nota Fiscal Eletrônica e a Nota Fiscal Digital servirão para confrontar com os tributos federais declarados pela pessoa física ou jurídica, sendo que os bancos, em síntese, já estão obrigados a prestarem semestralmente informações sobre movimentações financeiras em quantias superiores a R$ 5 mil, no caso de pessoas físicas, e a R$ 10 mil, no caso de pessoas jurídicas (IN RFB 802/07 – DIMOF).
Neste aprimoramento com o fito de aumentar a arrecadação sem o aumento da carga tributaria, desde 2006 está em funcionamento o T-Rex, um supercomputador montado nos Estados Unidos e instalado no Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), em São Paulo, que leva o nome do devastador Tiranossauro Rex, capaz de cruzar informações – com rapidez e precisão — de um número de contribuintes equivalente ao do Brasil, dos EUA e da Alemanha juntos.
No intuito do uso desse recurso extremamente eficiente, a Receita Federal do Brasil utiliza-se do software "Harpia", um sistema de inteligência artificial desenvolvido em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e com o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), capaz de cruzar uma quantidade elevada de dados e fazer correlação entre eles. O programa auxiliará os fiscais da Receita a serem mais precisos na escolha dos alvos (empresas e pessoas físicas) que serão investigados.
Conforme noticiado, o “Harpia” está sendo desenvolvido em módulos, e o primeiro colocado em funcionamento recentemente é especifico para a área de comércio exterior, com o objetivo de reduzir fraudes nas importações, bem como diminuir o tempo dos processos de despachos aduaneiros e liberação de mercadorias, assim como reduzir custos operacionais, para fins de valoração e combate ao subfaturamento. O foco inicial são as empresas importadoras. Todo o controle para a exportação ficará para uma segunda fase do projeto.
Espera-se em pouco tempo uma integração e unificação dos cadastros do Sistema Harpia com o SPED — Sistema Público de Escrituração Fiscal —, esse último, que consiste na modernização da sistemática atual do cumprimento das obrigações fiscais e acessórias, transmitidas pelos contribuintes às administrações tributárias e aos órgãos fiscalizadores.
Muitas são as especulações com o implemento deste serviço à sociedade, desde que as empresas optantes pelo Simples serão as mais afetadas até que a Declaração de Imposto sobre a Renda será realizada pelo próprio Fisco, tendo o contribuinte apenas que anuir e pagar o declarado, ante todas as informações já em poder do Estado.
A única certeza que há é que as empresas sonegadoras devem compreender que esta postura não mais condiz com a realidade do país, haja vista que tal conduta aleija a sociedade, retirando dinheiro público dos possíveis investimentos, bem como exerce concorrência desleal ao ter uma redução ilícita de preço de seus produtos e serviços ofertados no mercado.
Claro que sempre há de surgir a “explicação” de que só existe sonegação devido ao mau uso do dinheiro público ou à corrupção. Entretanto, como discorrido no começo, qualquer tributo é compulsório, não sendo esta a forma correta de “demonstrar descontentamento”.
O sistema jurídico brasileiro prescreve diversas formas de combate, desde o voto direto, secreto e universal, até a Ação Popular ou a Ação Civil Pública, além de um órgão independente apto a encampar a luta contra a corrupção: o Ministério Público.
Nesta toada, as empresas devem planejar cuidadosamente a maneira do exercício de suas atividades com o fito de, tendo em vista o sistema tributário, escolher o caminho menos oneroso. Contudo, nunca, e agora muito menos que antes, há de escolher o caminho da ilicitude.
As empresas, por meio de seus controladores, devem compreender que a revolução tecnológica está surtindo efeitos positivos para a arrecadação do Estado, que nada mais é do que a distribuição de cidadania aos administrados. Tentar nadar na contramão desta correnteza é assumir o risco de ver perigar uma sociedade empresarial, algumas com centenas de anos.